Noivas estão bastante familiarizadas com os chamados “livrinhos” ou “guia dos noivos”, comuns nas igrejas. Mas, segundo a Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor de São Paulo (Procon – SP), eles são ilegais.
“Em alguns casos, o livrinho serve para proteger os noivos. Como muitas empresas davam golpes, as igrejas passaram a exigir o CNPJ e o contrato social para poder indicar aos noivos. Em outros, foi mesmo criado para arrecadar dinheiro para a igreja”, comenta o fotógrafo especializado em casamentos Célio Coscia.
De acordo com Maíra Feltrin Alves, assessora técnica do Procon, as igrejas podem fazer exigências com relação ao espaço, mas não com relação aos serviços a serem contratados. “O consumidor deve ter a liberdade de contratar os profissionais que eles achem adequados”, diz Maíra.
“Pode haver uma lista como mera sugestão, não como imposição. Não há motivos na lei para impedir que qualquer outro profissional atue na igreja”, atesta Maíra. Não foi como mera sugestão que a noiva Ana Paula Jacinto, que se casou em março do ano passado, recebeu as recomendações da Matriz de São José, em Mogi Mirim, estado de São Paulo.
Segundo Ana, ela foi obrigada a usar o serviço de cerimonial da igreja. “Descobri quando fui marcar a data que as cerimonialistas que tinha contratado para a minha festa não poderiam pôr os pés na igreja, apenas na escada. Elas foram para me ajudar com alguns detalhes e ficaram no meio da praça”, lembra.
Além da exigência, relembra a noiva, os cerimonialistas da própria Igreja não fizeram um trabalho exemplar. “Eles abriram a porta quando os clarins estavam tocando. Ou seja, quando a marcha nupcial começou a tocar, eu já estava no meio da igreja. Foi um desastre”, diz Ana. Ela ainda conta que os cerimonialistas da igreja destrataram a sua mãe e desorganizaram toda a ordem que a noiva tinha imaginado para a cerimônia. “Tenho certeza que teria sido tudo perfeito se eu usasse as cerimonialistas que queria”, diz.
Nem todas as igrejas proíbem fornecedores de fora de sua lista. Algumas delas permitem ao casal contratar serviços não listados mediante o pagamento de uma taxa. A analista comercial Carolina Leite vai se casar em fevereiro do ano que vem e diz que a multa para contratação de uma decoradora não credenciada era de R$ 500. “Tive que ficar com a decoradora da igreja mesmo e não a que está trabalhando na minha festa. Contra a minha vontade”, diz Carolina.
Givanildo Costa, secretário da Paróquia São Luis Gonzaga, explica que as taxas cobradas pela igreja não são cobradas dos casais, e sim dos fornecedores. Mas admite que, no fim, os fornecedores não têm muito a fazer a não ser repassar as taxas para os noivos. “A maioria das empresas acrescenta a cobrança extra no valor do serviço”, confirma Célio. Na visão da técnica do Procon, a cobrança de taxas não se justifica, porque o consumidor tem a livre escolha garantida por lei.
Para fazer parte do livrinho, os profissionais também pagam uma taxa. Givanildo define o valor como um investimento a ser feito por parte dos fornecedores. “Quem se cadastra, paga e faz um investimento de marketing e divulgação. Muitos noivos vêm aqui e pedem informação sobre casamento, então damos o guia dos noivos”, diz.
Segundo o padre Antônio Aparecido Pereira, porta-voz da Arquidiocese de São Paulo, não existe exigência ou recomendação alguma do clero ou da hierarquia católica para o uso e distribuição do “livrinho”. “É uma iniciativa de cada paróquia”, afirma.
Existe, sim, uma recomendação da Igreja Católica sobre o valor da taxa para realização de um casamento: ele não pode ser maior que o valor de se casar no civil. “Criou-se uma indústria do matrimônio, quando, na verdade, o que é preciso para se casar são apenas um homem e uma mulher que se amam, um padre e duas testemunhas”, diz Antônio.
“A gente sempre desconfia que essas taxas estipuladas pela igreja não são legais. Mas todas agem da mesma forma”, diz a noiva Carolina. Como a maioria dos casais prefere não criar mais problemas no meio da organização do casamento, as paróquias dificilmente são acionadas.
Maíra Feltrin recomenda ao casal enviar uma carta para o padre responsável pela paróquia, com uma solicitação formal dos serviços que os noivos desejam usar. Se a carta não funcionar, o casal ainda pode tentar uma conversa ao vivo antes de acionar o Procon. “Como consumidores, os noivos devem questionar caso se sintam prejudicados”, finaliza.
Fonte:
Jornal Correio do Estado
27 de Agosto de 2011